Dando continuidade à divulgação da pesquisa “Laços Patrimoniais: Construindo um Inventário Colaborativo para Bento Gonçalves”, agora o Museu do Imigrante divulga a pesquisa sobre o Eixo 3 que compreende o Passo das Antas: Veríssimo de Mattos, Km2 e Passo Velho. O propósito da pesquisa é de atualizar o inventário realizado em 1994.
A equipe do projeto é formada por Deise Formolo, Cristiane Bertoco, Ivani Pelicer, Angela Maria Marini, Sabrina De Lima Greselle e Margit Arnold.
O projeto “Laços Patrimoniais: construindo um inventário colaborativo para Bento Gonçalves” recebeu recursos de R$ 50 mil da Secretaria de Estado da Cultura, sendo selecionado no âmbito do Edital SEDAC nº 01/2019 “FAC Educação Patrimonial”.
Eixo 3 – Passo das Antas – Veríssimo de Mattos, Km2 e Passo Velho
As localidades de Veríssimo de Mattos, Km2 e Passo Velho, situam-se na área denominada Terras Particulares, que não foram divididas em lotes coloniais pela Comissão de Terras do Governo, mas planejada para divisão em colônias e chácaras, a partir do final do século XIX. Havia planejamento para o local da igreja, escola e cemitério, sendo que as chácaras seguiram um traçado ortogonal, porém esse formato não se concretizou uma vez que poucas famílias compraram a maioria das chácaras (CAPRARA e LUCHESE, 2001).
Em consulta às tabelas dos lotes é possível verificar a ocupação das Terras Particulares a partir de 1895 até 1930, onde a maioria possuía negócios relacionados ao comércio, indústria artesanal ou transportes. Identificam-se nesses lotes diversos alambiques, casas de pasto, negócios, casa de baile, inspetoria e arrematante do Passo, entre outros. Já a tabela das chácaras não apresenta a divisão dos lotes, mas o nome dos proprietários e seus negócios, entre 1920 e 1930, onde, além dos citados anteriormente, há hotéis, fábrica de queijo, sapataria e fábrica de cerveja.
A maioria dos nomes dos proprietários desses lotes é de imigrantes italianos, porém alerta-se que isso não significa a hegemonia desse grupo, uma vez que era um lugar de passagem e os caboclos e negros não tinham direito à propriedade, instalando-se a margem das estradas e rios. Observa-se na colônia Alfredo Chaves, no lado oposto do Passo Velho, os nomes de proprietários indicam a mistura de etnias polonesa e italiana com sobrenomes brasileiros, denotando a influência da passagem de tropeiros vindos da Região de Lagoa Vermelha que seguiam ao passo das Antas e dos balseiros que se instalaram no local.
A ocupação do terreno no Passo Velho ocorre na parte mais plana, próxima ao rio, seguindo um assentamento linear, típico das estradas de apoio às tropas, onde comércios e serviços davam apoio à passagem de tropeiros e viajantes. Os principais elementos da paisagem são o Rio das Antas, o movimento do trem e as edificações antigas da época do funcionamento da balsa. Atualmente, identifica-se a capela e a sede comunitária como elementos centralizadores da comunidade, porém à época do funcionamento da barca, a relação com o rio era muito maior, o que reduziu após os limites impostos pelas construções das barragens.
Em suas memórias sobre a localidade, Antonio Ducatti Neto (1979) aponta a relação da localidade com o transporte fluvial, através de barcas e balsas e o transporte através da estrada Buarque de Macedo, por meio dos tropeiros e dos carreteiros, que utilizavam mulas para puxar as carretas ou mesmo para carregar os produtos. O autor descreve a região como um ambiente muito movimentado e diversificado quanto às etnias, apontando identidade diferente em relação às outras comunidades da colônia, em especial com Faria Lemos.
A partir da chegada do Batalhão Ferroviário em 1943, para a construção do ramal que ligaria Bento Gonçalves a Vacaria, na parte mais alta do morro são construídos os núcleos de Veríssimo de Matos e KM2. O trem também passaria pelo Passo Velho anos mais tarde, com a construção do Tronco Principal Sul, ainda ativo, ligando as estações de Santa Tereza e Alcântara à Jabuticaba. A distribuição das construções ferroviárias é executada de forma linear, ao longo da ferrovia, em dois núcleos que são divididos pela topografia, embora sejam interligados por uma ligação rodoviária e pela linha ferroviária, que dá a volta no morro.
A inter-relação entre essas localidades e o nomadismo das populações negras até então, é registrada pelo relato de Zilda Marques da Silva Nuncio de que sua família veio acompanhando seu pai, que trabalhava para o Batalhão Ferroviário como guarda-freios.
As construções das Vilas Ferroviárias seguiam um projeto padrão, que está registrado no relatório do 1º Batalhão Ferroviário de junho de 1950, onde as construções são divididas em casa para agente, casa para conferente ou telegrafista, casa para mestre de linha, casas isoladas para trabalhadores, bombeiros e guarda chaves, escola, estação de 3ª e 4ª classe, casa de trole e caixas d’água, além de viadutos e túneis. Segundo o relatório citado, até aquela data, as 4 estações já estavam construídas com seus respectivos agrupamentos de casas e 2 escolas.
Após visitas às vilas ferroviárias, foi possível identificar que as casas de Veríssimo de Mattos caracterizam-se como casas para trabalhadores. Destaca-se o fato dessas construções em linguagem protomoderna possuírem ornamentos retilíneos ao lado das janelas, que lembram o déco. Há uma distância entre essas, o pátio de manobra e a capela e cemitério da localidade. Junto à manobra, cuja paisagem gera uma amplitude visual como se ali houvessem outras construções anteriormente, hoje há apenas uma caixa d’água e casas de madeira cujos relatos informam serem de imigrantes italianos.
No Km2, iniciando-se o roteiro pelo acesso da rodovia BR 470, verifica-se, à direita, a estação de 3ª classe, em linguagem Art Déco e a caixa d’água. A esquerda, segue uma casa para agente, casas para conferencista ou telegrafista e casas para mestre de linha. A seguir está a escola e, após alguma distância, as casas para trabalhadores. Há registros fotográficos de que, além dessas casas de alvenaria existiam casas de madeira, ocupando um espaço edificado bem maior do que o atual. A linguagem das casas segue um padrão de linguagem protomoderna com alguns ornamentos retilíneos do Déco, acima e abaixo das janelas das casas dos oficiais, com destaque para as colunas das varandas. Nas casas de trabalhadores, segue o mesmo padrão de Veríssimo de Mattos, porém várias casas encontram-se sem telhado, contando apenas com a laje de cobertura.
Além das edificações construídas pelo Batalhão, outras duas edificações podem ser consideradas parte do conjunto. Um antigo hotel da família Cavalca, na Rodovia BR 470, próximo ao acesso principal ao KM2 e Passo Velho, é uma construção característica do período tardio da imigração italiana, que recebeu ornamentos Déco nas fachadas, de forma similar às construções do Batalhão. Do outro lado, próximo ao acesso de Veríssimo de Mattos pela rodovia, outra construção de alvenaria de dois pavimentos, conhecida como Casarão, lembra as antigas casas de pasto do período de apogeu da imigração.
Nenhuma das edificações da época do Batalhão Ferroviário é inventariada, apenas a ponte Ernesto Dornelles, construída a partir da década de 40 e inaugurada em 1952, provavelmente o primeiro monumento modernista da cidade e símbolo do DAER – Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem. Os conjuntos do KM2 e Veríssimo de Mattos constam no atual Plano Diretor do Município como APPACs – Áreas de Preservação à Paisagem Cultural, caracterizadas como Áreas Especiais de Interesse Histórico e Social, cujas construções com mais de 50 anos e suas paisagens são consideradas de valor histórico, cultural e paisagístico.
Tendo em vista a análise do local, bem como tendo como referência os levantamentos de Fensterseifer (2016) sobre a localidade, indica-se a inclusão no inventário das edificações, túneis e viadutos, sendo recomendável ainda a chancela paisagística dessas construções, juntamente com a linha férrea e vistas do Rio das Antas dessas vilas ferroviárias. Também é recomendável a realização de projetos de revitalização com atuação de responsáveis pela habitação e assistência social, em parceria com a Secretaria de Cultura e Museu do Imigrante, de forma a possibilitar a regularização das ocupações de interesse social, a melhoria das condições de vida dos moradores e o fortalecimento de vínculo da população com o lugar.
Entre as construções que integram o inventário atualmente, no Passo Velho, estão 4 construções de madeira, sendo uma casa, o antigo hotel, atualmente de uso residencial, o antigo moinho e a antiga cooperativa (com a denominação de casa Silveira Filho) e duas casas de alvenaria, a maioria sem uso, além de um jazigo e da Ponte Ernesto Dornelles. Reconhecem-se também algumas construções de madeira do período tardio da imigração italiana, identificadas no estudo de Dal Lago (2018), como integrantes do conjunto histórico. Observa-se ainda que elementos como o cemitério do Passo Velho e o túnel próximo à ponte Ernesto Dornelles, assim como matas e rios, possuem significados religiosos afro-brasileiros, segundo registros do Conselho Municipal de Povos Tradicionais de Matriz Africana.
Embora a maioria das construções não esteja habitável, pode-se considerar o seu valor excepcional pelas características arquitetônicas vernaculares, com influências do período de apogeu da imigração italiana e da arquitetura colonial luso-brasileira, assim como por seu estado de conservação razoável, considerando o material com que foram construídas e as condições do local. Um paiol que fazia conjunto com a Casa Favaretto, foi demolido, assim como o antigo cemitério junto ao Rio das Antas, cujo novo cemitério foi construído acima da ferrovia, para onde foi transferido o Jazigo da família Silveira e o ossário.
No Plano Diretor, o Aglomerado Funcional Passo Velho é reconhecido pela proteção das edificações antigas, vegetação nativa, os lugares notáveis, tendo como condições a proteção e revitalização dessas características, das atividades e comunidades tradicionais, a proximidade com o Rio das Antas e a ferrovia retratam a origem e história do mesmo. Para as edificações do Passo Velho, indica-se a reafirmação do valor das mesmas no inventário, identificando-as por meio do reconhecimento do conjunto histórico, para o qual seria indicado o tombamento, tendo como base os estudos e levantamentos realizados por Lago (2018), em estágio com a Universidade de Caxias do Sul.
Fonte: Assessoria de Comunicação Social da Prefeitura de Bento Gonçalves
Foto: Wagner Meneguzzi / Museu do Imigrante / Divulgação
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