Músicas ambientais francesas, portuguesas e italianas “embalam” os dias e as noites das 3.500 oliveiras da Pousada Olival Vila do Segredo, em Caçapava do Sul, região da Campanha do Rio Grande do Sul. Construída em estilo colonial português em 2020 e inaugurada em janeiro de 2021, ela é o marco do olivoturismo no Estado, um setor que cresce a cada dia. O proprietário Renato Fernandes coloca música durante 24 horas para as árvores “escutarem”. “São seres vivos também. E eu passo por elas e faço carinho”, conta ele que, junto com a esposa Cinara, administra o primeiro empreendimento hoteleiro aberto na Rota das Oliveiras, instituída por lei estadual, em 2019. Atualmente, cerca de 10 empresas gaúchas já atuam no setor.
E o que é olivoturismo? É a área do turismo que se dedica a mostrar aos visitantes como é feito o cultivo das oliveiras, a produção das azeitonas, a elaboração e a degustação dos azeites extravirgens. Segundo Fernandes, que também é presidente do Instituto Brasileiro de Olivicultura (Ibraoliva), com a evolução da produção de azeite, o Rio Grande do Sul tem atrações para os turistas que buscam experiências inéditas em suas viagens. “O segmento está crescendo, e considero a olivicultura a nova fronteira do turismo”.
Fernandes explica que tudo começou com o projeto da construção da fazenda para cultivo da oliva e fabricação do Azeite Vila do Segredo. “Projeto que passa por um resgate familiar. Trabalhar com esse alimento sagrado e esta árvore milenar nos traz a sensação de uma missão com gerações futuras. Acreditamos que estamos contribuindo para o desenvolvimento social, oportunizando uma qualidade de vida mais saudável e sustentável aos nossos descendentes”, diz com orgulho. “É a indústria sem chaminé, que promove alegria e paz”.
A fazenda possui 12 hectares e 3.500 oliveiras em fase de crescimento. “Na safra de 2020 a produção foi de cerca de quatro toneladas de azeitonas. Na próxima temos expectativa de dobrar esse número”, espera Fernandes.
Ele conta que a pousada levou dois anos para ser construída. “É uma homenagem ao ponto turístico Pedra do Segredo, que fica no parque de mesmo nome em Caçapava. E temos a Serra do Segredo como paisagem. É uma localidade histórica. As primeiras plantações de oliveiras aconteceram no município”, ilustra o produtor.
“Aqui, os turistas ficam à vontade. Mas sempre fazemos degustação do nosso azeite, com todas as informações sobre ele. E ainda temos um piquenique a partir das 15h para hóspedes que desejarem e também para quem quer vir aqui só para conhecer nosso produto e desfrutar do pôr do sol”, esclarece Fernandes.
Como é o caso dos namorados Bibiana Casanova, advogada, e Gonzalo Giacomini, dentista, ambos de 33 anos. “Queríamos ficar hospedados, mas as quatro suítes já estavam ocupadas, então, optamos pelo piquenique. Já tinha vindo aqui com umas amigas. Gostei tanto que quis comemorar o aniversário hoje do Gonzalo vendo esse lindo pôr do sol e curtindo os olivais”, diz a advogada.
Ela é natural de São Sepé, mas mora em Dom Pedrito. Ele nasceu e vive em Santana do Livramento. “Como sou desta região, acho importante valorizá-la e aproveito para ver minha família. O lugar é muito lindo e foi aqui que aprendi a conhecer e apreciar o azeite de oliva que eles produzem. É maravilhoso. Hoje sou uma consumidora”, admite Bibiana.
Para a diretora do Ibraoliva e sócia-proprietária do azeite Don José, Rosane Abdala, o olivoturismo é uma oportunidade que os produtores possuem de ter uma renda extra. “A oliveira demora para produzir, em média, cinco anos, mas ela está em plena produção a partir dos oito ou dez anos. Então, neste período, o turismo ajuda muito na manutenção, em toda a estrutura, na cadeia de produção do azeite”, destaca.
“É uma atividade que vem crescendo. O olivoturismo está entrando na região da Campanha, por exemplo, como uma oportunidade, uma opção para as pessoas que querem curtir, passear e ver algo diferente do que estão acostumados nos grandes centros”, pontua Rosane.
De acordo com a diretora, o turismo, em todas as suas formas, está trazendo de volta para as propriedades rurais os jovens. “Quando recebemos grupos, precisamos não só da mão de obra para nos auxiliar e fazer o cardápio, mas são vários outros produtos que agregamos. E isso aumenta a renda de outras pessoas que estão envolvidas nisso. Entendo que para as propriedades rurais, para a juventude que saiu do campo é uma opção maravilhosa, porque tu manténs o contato, te mantém atualizado, fazendo uma atividade extremamente gratificante”, diz Rosane.
“Acho que o olivoturismo, o turismo rural é uma opção muito boa para o nosso Rio Grande do Sul e, principalmente, para a metade Sul, onde está inserido o Bioma Pampa. E para Caçapava do Sul, onde temos as belezas naturais: as Guaritas, as Minas do Camaquã, a Pedra do Segredo. É fundamental e veio para ficar. É um processo que está acontecendo de maneira sustentável e consistente”, conclui.
Por sua vez, o coordenador do Programa Pró-Oliva da Secretaria da Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento Rural (SEAPDR), Paulo Lipp João, acredita que o olivoturismo é uma alternativa tanto para diversificar a renda dos produtores, quanto para o público que quer conhecer a magia das oliveiras e dos azeites. “É algo novo e diferente que está aqui no Rio Grande do Sul bem acessível aos turistas de todo o Brasil. A SEAPDR, através do Programa Pró-Oliva, está divulgando os locais e os contatos para os interessados em conhecer a produção e degustar excelentes azeites extravirgens gaúchos”.
Olivas do Sul
Caminhar pela Alameda das Centenárias, no Pomar Olivas do Sul, em Cachoeira do Sul, é voltar no tempo. As 66 oliveiras de 130 anos, que foram resgatadas e replantadas em 2011 pelo casal Vani e José Alberto Aued, emanam a energia desses vegetais que podem chegar aos milhares de anos de vida. Elas se juntam às outras oliveiras mais jovens, somando 7.500 árvores em 25 hectares. “A primeira muda foi em julho de 2006”, conta Vani, que tem a expectativa de colher até 200 toneladas de azeitonas na safra 2021-2022.
José Alberto Aued explica que, no início, eram 12,7 hectares, com 3.500 árvores. “Queríamos demonstrar que uma pequena propriedade não precisava ser só autossustentável, mas poderia ser altamente rentável. E queríamos uma cultura que fosse diferente de tudo o que existia na época. A gente não sabia se o Rio Grande do Sul podia produzir oliveiras. Então, entramos de cabeça para mostrar se isso era ou não possível. Usamos recursos técnicos e pesquisas de universidades para o planejamento do negócio”.
De descendência árabe, Aued aprendeu que tinha que montar seu negócio considerando o erro dos outros. “Só que tivemos que aprender com nossos próprios erros, pois fomos pioneiros. Aprendemos a adaptar a olivicultura para o solo e o clima do Rio Grande do Sul. Estamos satisfeitos, pois cumprimos nosso objetivo. Basta olhar para nosso pomar de 23 variedades de oliveiras, sendo as principais: Koroneiki (grega), Arbequina e Arbosana (espanholas), e Coratina (italiana)”, destaca.
“Produzimos e comercializamos o primeiro azeite de oliva extravirgem do Brasil e o primeiro, em 2011, a constar no Flos Olei – catálogo que reúne os melhores 500 azeites do mundo. Além dos quatro monovarietais, produzimos dois blends (mistura de varietais): o Blend Riserva D’oro e o Blend Centenária. Já recebemos mais de 50 prêmios pelos nossos azeites”, diz o produtor.
Além do pomar em Cachoeira do Sul, a empresa possui um em Encruzilhada do Sul, desde 2017, com 26 mil oliveiras em 90 hectares. A expectativa de colheita para a safra 2021-2022 é de até 80 mil quilos de azeitona.
A Olivas do Sul também oferece olivoturismo, mesmo antes da modalidade existir. “Em 2008, ninguém ainda falava nesse tipo de turismo aqui no Estado, e a gente já recebia excursões de estudantes universitários, empresários e investidores interessados em conhecer a cultura. Muitos dos que vieram investiram em pomares de oliveiras. A Olivas do Sul é uma grande incentivadora da olivicultura desde o começo, já ajudamos muita gente a implantar seus pomares. Desde o início, já recebemos milhares de visitantes do Brasil e do exterior”, comenta Aued.
Os turistas que conhecem a Olivas do Sul aprendem a degustar os azeites, a diferenciar os bons dos maus azeites (ou falsificados) e passeiam pela Alameda das Centenárias. Foi o que aconteceu com o grupo de oito descendentes de gregos das famílias Blazoudakis e Isdra, que participam da Colônia Grega em Porto Alegre. A azeitóloga e sommelier de azeite Ana Tassia Blazoudakis realizou uma análise sensorial de como degustar o produto. “Estamos criando uma cultura do sabor. O olivoturismo, dentro da olivocultura, vem crescendo bastante, portanto, a gente está fomentando um mercado em crescimento, porque promove não só uma cidade, não só um produtor, mas a região inteira”.
A empresária e fazendeira Sophie Isdra, de 72 anos, adorou a análise sensorial. “Tenho muito interesse em aprender sobre azeite de oliva. É maravilhoso, porque é conhecimento. E tudo que se aprende é impossível de ser roubado”.
Sobre a Rota das Oliveiras
Instituída por lei estadual, em 2019, a Rota das Oliveiras visa incentivar o turismo rural associado à olivicultura, com o objetivo de fomentar o desenvolvimento deste setor que cresce no Rio Grande do Sul. Fazem parte os municípios de Bagé, Barra do Ribeiro, Cachoeira do Sul, Caçapava do Sul, Camaquã, Candiota, Canguçu, Dom Feliciano, Dom Pedrito, Encruzilhada do Sul, Formigueiro, Hulha Negra, Pantano Grande, Pinheiro Machado, Piratini, Restinga Seca, Rosário do Sul, Santa Margarida do Sul, Santana do Livramento, São Gabriel, São João do Polêsine, São Sepé, Sentinela do Sul e Vila Nova do Sul.
Numa segunda etapa devem constar: Arroio dos Ratos, Bom Jesus, Chuvisca, Glorinha, Gramado, Ibirama, Mariana Pimentel, Pedras Altas, Restinga Seca, São Francisco de Paula, Sertão Santana, Triunfo, Vacaria, Vale Verde e Viamão.
Mais de 40 marcas de azeite já são comercializadas por produtores gaúchos e muitos locais estão abertos à visitação no Rio Grande do Sul.
Fonte: SEAPDR
Foto: Fernando Dias / SEAPDR / Divulgação
(RM)
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