Indicações Geográficas ressaltam a história de produtos gaúchos tradicionais como vinhos, carnes e doces

Com 14 registros, o Rio Grande do Sul é o segundo estado com mais IGs no país, ficando atrás apenas de Minas Gerais

O estado do Rio Grande do Sul é conhecido como a terra do chimarrão e muito apreciado pelo inverno rigoroso, o que permite aos visitantes uma experiência cultural única. Mas lá, no Sul do Brasil, outros produtos também ganham reconhecimento e notoriedade pelo valor e tradição que carregam, como é o caso das Indicações Geográficas (IGs) registradas na região.

Para propagar esses produtos já existentes no Rio Grande do Sul, bem como servir de incentivo para que produtores de outras regiões sejam estimulados a se organizar e ter reconhecidas as tradições e o saber-fazer local, valorizando o seu produto, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento lançou a publicação “Indicações Geográficas do Rio Grande do Sul: registradas até março de 2021”. A publicação traz um compilado de artigos escritos por diversos autores, representando as instituições parceiras deste trabalho e, também, os produtores vinculados às indicações geográficas.

A pesquisadora em Tecnologia e Ciências Agrícolas e idealizadora da publicação, Edna Maria Ferronatto, conta como foi a ideia de criação do livro e o porquê da união de todos os registros num material. “Eu vi que muita gente do Brasil estava escrevendo sobre as Indicações Geográficas do Rio Grande do Sul, porque elas foram as referências para as demais brasileiras. Também fiquei muito curiosa de saber como é que essas pessoas que apoiaram a estruturação dessas IGs, como é que lidaram com isso. Indicação geográfica todo mundo sabe que é um coletivo de toda uma região, de todas as pessoas da região, de todos os elos da cadeia da área delimitada” explica Edna, que é servidora do Mapa na Superintendência Federal da Agricultura do Rio Grande do Sul.

Existem dois tipos de Indicação Geográfica. Uma é a Indicação de Procedência (IP), sendo o nome geográfico de país, cidade, região ou localidade de seu território, que se tenha tornado conhecido como centro de extração, produção ou fabricação de determinado produto ou de prestação de determinado serviço. E a Denominação de Origem (DO) é o nome geográfico de país, cidade, região ou localidade de seu território, que designe produto ou serviço cujas qualidades ou características se devam exclusiva ou essencialmente ao meio geográfico, incluídos fatores naturais e humanos.

A chegada de um registro de IG para uma região traz benefícios não só para o produtor, que está ligado diretamente com o saber-fazer, mas também para a economia do território em que ela se encontra. Trazendo, por exemplo, mais turistas, gerando mais empregos, trabalhando para beneficiar a gastronomia regional e promovendo o desenvolvimento rural.

“As indicações geográficas não são criadas, elas já existem, são produtos que tem aquela reputação vinculada ao nome geográfico daquela região, e aquela história. Então o Mapa  trabalha no reconhecimento dessas áreas. Os benefícios que vem geralmente estão associados a melhor estruturação da cadeia, ao fortalecimento associativismo, cooperativismo. Isso gera orgulho nos produtores que começam a valorizar aquilo que eles têm, começam a ter um olhar diferenciado para aquela história, para aquele produto”, disse a coordenadora de Indicação Geográfica de Produtos Agropecuários do Mapa, Débora Santiago, explicando o papel do Ministério nesse processo.

IGs Gaúchas

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Indicações Geográficas gaúchas

O Rio Grande do Sul é o segundo estado com mais Indicações Geográficas no país, ficando atrás apenas de Minas Gerais, que possui 16 registros. Quando fala-se da cultura gaúcha, cujas bases se dão na vida do campo e estão associadas a valorosos costumes, encontra-se um terreno fértil para o surgimento de novas IGs. Estas, por sua vez, tornam-se importantes ferramentas de organização local, valorização dos produtos e preservação da tradição, contribuindo para o desenvolvimento dos territórios e para a economia do estado.

A lista das IGs gaúchas é extensa, vai desde doces até vinhos e espumantes. Hoje, 14 IGs já foram registradas e apenas duas não são listadas no livro, devido à data que foram reconhecidas, são elas: Mel de melato de bracatinga, no Planalto Planalto Sul Brasileiro, e chocolate de Gramado. No caso do mel de bracatinga, o status dessa IG é interestadual, pois fica em algumas regiões do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e no Paraná.

As outras IGs estão detalhadas no livro: o Couro Acabado do Vale dos Sinos (IP); o Doce de Pelotas (IP); a Carne do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional (IP); o Queijo Artesanal Serrano dos Campos de Cima da Serra (DO); e o Arroz do Litoral Norte Gaúcho (DO). Na parte de vinhos, temos: os Vinhos dos Vales dos Vinhedos, de Pinto Bandeira (IP), Altos Montes (IP), Monte Belo (IP), Farroupilha (IP) e Campanha Gaúcha (IP).

Um desses registros é a primeira indicação Geográfica (IG) do Brasil, através da estruturação da Indicação de Procedência (IP): Vale dos Vinhedos para vinho tinto, branco e espumante. Esse registro representou uma inovação, que foi apropriada pelo setor vitivinícola e, posteriormente, por diversas outras IGs de produtos no país. “A partir da IP Vale dos Vinhedos, outras regiões de produção desenvolveram seus processos de estruturação e registro de indicações geográficas de vinhos”, diz o livro. Até 2021, o estado do Rio Grande do Sul contava com sete indicações geográficas de vinhos registradas, entre IP e DO.

Para a produção de vinho, o Rio Grande do Sul é diferenciado por suas características próprias atribuídas pelos biomas, climas, solos, relevos, variedades de uvas, tecnologias vitícolas e pelo aspecto histórico. Cada indicação geográfica traz uma identidade única, sendo resultado da construção do território vitivinícola.

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Outro produto a receber o registro é a Carne do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional. A Associação dos Produtores do Pampa Meridional do Estado do Rio Grande do Sul (Apropampa) recebeu em 2006 o primeiro registro para carne bovina como Indicação de Procedência (IP) no Brasil, oriunda de sistemas de produção de bovinos, delimitados geograficamente numa região denominada Pampa Meridional. Com a participação de muitos cooperadores, a organização comunica aos consumidores tudo que está contido na embalagem da carne: qualidade, saúde, preservação do bioma Pampa, cuidado com o meio ambiente e com os animais e a cultura intrínseca do gaúcho.

Segundo a publicação, “a carne é gerada em um sistema produtivo que não desmata e que tem a potencial pegada de carbono neutro. A Pampa Gaúcho é distinta daquela praticada no resto do Brasil e no mundo. Isto se deve a vários aspectos, mas notadamente pelo ecossistema, pelo clima, e pelas raças taurinas especiais para corte, criadas soltas, predominantemente a pasto”.

Já em Pelotas, cidade conhecida pela excelência de seus doces, um grupo de doceiras percebeu que os outros lugares do Brasil estavam fazendo os doces tradicionais de Pelotas. Foi então que decidiram solicitar a proteção de um Indicação de Procedência ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI).

Uma das primeiras presidentes da Associação de Produtores de Doces de Pelotas, Maria Helena Jeske, explicou que, à época, o principal desafio foi motivar as doceiras a compartilhar as próprias receitas. “As receitas muitas vezes são guardadas só para a família, as pessoas não tinham experiência em trabalhar em grupo, e se enxergavam como concorrentes”, contou.

Bem-casado, quindim, ninho, camafeu, olho de sogra, papo de anjo, quaijadinha e muitos outros doces fazem parte dessa IP, ao todo são 14 doces. E foi através desses produtos que muitas empresas de Pelotas conquistam credibilidade, visibilidade, confiança e levam o trabalho além das fronteiras do estado. Além disso, os consumidores podem saber a procedência de cada produto por meio de um site de rastreabilidade disponibilizado pela Associação de Produtores de Doces de Pelotas que, segundo eles, “é uma informação importante para os consumidores e as indicações geográficas ajudam a transmitir este valor ao mercado”.

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O camafeu é um doce com a massa feita de nozes chilena ou pecan. Foto: Associação Doce de Pelotas

Cooperação

Na Superintendência Federal de Agricultura do Rio Grande do Sul, assim como em outros estados, o Mapa disponibiliza um técnico capacitado na temática que é instruído a prestar apoio na região. Esse técnico é responsável por identificar essas regiões potenciais que já tem os produtos vinculados ao nome geográfico, pelo diagnóstico da cadeia, estruturação e saber o que pode ser melhorado.

“A nossa atuação é muito voltada para o desenvolvimento territorial e rural das regiões, e as indicações geográficas são ferramentas para promover agregação de valor, geração de renda, organização das cadeias produtivas. Então a nossa atuação é muito na promoção mesmo desse signo distintivo para organização e, assim, que os produtores possam se beneficiar desse registro protegendo o nome, levando essa história, esses produtos tradicionais para o comércio”, salientou a coordenadora de Indicação Geográfica do Mapa.

O marco legal das Indicações Geográficas no Brasil é a Lei da Propriedade Industrial (nº 9.279/1996), que regula os direitos e obrigações sobre propriedade industrial e intelectual no Brasil. Atualmente, sua regulamentação segue a Portaria INPI/PR nº 04/2022, que estabelece as condições  para o registro das IGs. O Instituto Nacional de Propriedade Industrial – INPI é a instituição que concede o registro legal de IG no país.

Consulte aqui o mapa interativo com todas as Indicações Geográficas do Brasil.

O livro

Dividido em sete capítulos, o livro “Indicações Geográficas do Rio Grande do Sul: registradas até março de 2021” aborda descrição, características e as histórias de cada produto registrado. Os capítulos incluem informações referentes às matérias tais como: os ambientes que favoreceram a obtenção de produtos diferenciados; as práticas de produção (o modo de fazer local); as características e diferenciais do produto e comentários sobre as regulamentações e sua influência no produto.

Além de contar história dos produtos, o último capítulo da coletânea traz as principais questões sobre Indicações Geográficas encaminhadas ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), autarquia federal responsável pelo registro das indicações geográficas e das marcas. Através do documento, o INPI pode tirar dúvidas recorrentes aos interessados no processo da IGs. De acordo com o livro, “há uma forte concentração de dúvidas em três tópicos principais: condições de registro, condições de uso da Indicação Geográfica e as diferenças entre Indicações Geográficas e marcas”.

Fonte: Ministério da Agricultura

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