Um estudo realizado como parte do trabalho de mestrado da nutricionista Cássia Medino Soares, apresentado no Programa de Pós-Graduação em Ciências em Gastroenterologia e Hepatologia da UFRGS, avaliou os níveis de vulnerabilidade alimentar de trabalhadores das unidades de triagem da Lomba do Pinheiro e da Vila Pinto, em Porto Alegre. 123 adultos foram submetidos a avaliações clínicas e nutricionais para detectar a possível presença de insegurança alimentar, o uso de substâncias químicas e a infecção por doenças sexualmente transmissíveis.
“Esse trabalho começou com a minha inserção na Coordenadoria de Segurança Alimentar e Nutricional. A partir daí, tive a ideia de trabalhar com o público mais vulnerável, então trabalhei com moradores de rua”, afirma Soares. “Mas também a gente atendia cozinhas dentro das comunidades de Porto Alegre, e uma das cozinhas que nos chamou mais a atenção foi dentro das unidades de reciclagem, principalmente na região da Lomba do Pinheiro, que é uma região de alta vulnerabilidade. Então decidimos estudar os trabalhadores desse local como projeto de mestrado”, complementa.
A vulnerabilidade social pode ser entendida como a incapacidade de uma pessoa para aproveitar-se das oportunidades econômicas e sociais necessárias para melhorar sua situação de bem-estar ou impedir sua deterioração. A pesquisadora afirma que em regiões de maior vulnerabilidade social, nas quais a renda é menor que um salário mínimo e insuficiente para garantir a alimentação adequada, surgem grandes taxas de insegurança alimentar, índices maiores de doenças infectocontagiosas, enfermidades secundárias e má nutrição.
No Brasil está regulado legalmente o direito à alimentação do trabalhador. O Estado desenvolve desde 1976 o Programa de Alimentação do Trabalhador — projeto criado com o objetivo de melhorar as condições nutricionais e de qualidade de vida dos trabalhadores, a redução de acidentes laborais e o aumento da produtividade. No entanto, nem sempre esse direito é assegurado para todos, pois o mercado informal, no qual se encontram os trabalhadores com maiores necessidades de acesso à nutrição adequada, acaba sendo geralmente desatendido. Trabalhadores das unidades de reciclagem se encontram geralmente neste grupo.
Para traçar o perfil de insegurança alimentar desses trabalhadores, a cientista utilizou a Escala Brasileira de Insegurança Alimentar. Essa escala prevê quatro categorias. A primeira, segurança alimentar, aplica-se a indivíduos que têm acesso regular e permanente a alimentos de qualidade em quantidade suficiente. Já a insegurança alimentar pode ser leve, moderada e grave. Segundo a pesquisadora, ela é considerada leve quando a pessoa possui preocupação ou incerteza quanto ao acesso aos alimentos no futuro e prefere garantir a quantidade dos produtos consumidos, diminuindo a qualidade dos mesmos. A insegurança alimentar moderada está presente quando se verifica a redução quantitativa de alimentos entre adultos. Já a insegurança alimentar grave é constatada com a redução quantitativa de alimentos até o limite do indivíduo experimentar fome no dia inteiro por falta de recursos para conseguir seus alimentos.
O estudo também utilizou para a avaliação o Teste de Rastreio do Envolvimento com Álcool, Tabaco e Substâncias para avaliar o uso de drogas nos catadores de resíduos. Testes rápidos foram usados para detectar HIV, hepatite B, hepatite C e sífilis. 58% dos voluntários avaliados eram negros; 66%, mulheres; e 73% tinham baixa escolaridade.
Os pesquisadores detectaram uma taxa de 74% de insegurança alimentar em algum grau, sendo 16,5% de insegurança severa. Também a presença de sobrepeso ou obesidade foi identificada em 57% dos participantes, sendo que 62% das mulheres e 22% dos homens apresentaram circunferência da cintura aumentada, fenômeno que pode aumentar os riscos para doenças cardiovasculares. O estudo identificou, ainda, que 47% dos indivíduos eram usuários ativos do tabaco e 12%, de bebidas alcoólicas. Segundo os resultados dos testes rápidos, os indivíduos tiveram uma taxa de positividade de 11% de infecção pela sífilis, seguida pela hepatite C (2%) e pelo HIV (1%).
A pesquisa revela que essa população é altamente vulnerável e apresenta um alto risco nutricional. Para Soares, os maiores desafios da nutrição dentro das cozinhas comunitárias que atendem principalmente a esses recicladores de resíduos são os aspectos culturais, o medo da fome e a resistência à mudança de hábitos. Muitos deles estão familiarizados a ingerir alimentos encontrados dentre os resíduos a fim de garantir a sobrevivência, uma vez que muitos não possuem alimento seguro disponível. Segundo a cientista, alguns dos recicladores que ganham uma porcentagem em dinheiro sobre o que reciclam conseguem comprar alguns alimentos para sua nutrição, mas por vezes não deixam de ingerir o que encontram nas esteiras, pois o medo da fome é maior. No caso desses últimos, a acessibilidade de preços é a prioridade, portanto alimentos ultraprocessados são os mais consumidos entre essa população, podendo levar, assim, ao desenvolvimento de doenças crônicas associadas à má alimentação, como a síndrome metabólica.
Fonte: UFRGS
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