A juíza Fernanda Ghiringhelli de Azevedo determinou nesta segunda-feira, dia 16, em audiência de custódia, a soltura de dois homens, sendo um de 32 e outro de 19 anos, que foram presos pela Brigada Militar (4°Batalhão de Polícia de Choque) e PATRES (Patrulhas Especiais) , por envolvimento em ocorrência de porte ilegal de arma de fogo no último domingo, dia 15, no Distrito de Faria Lemos, as margens da ERS-431, no interior de Bento Gonçalves. Na ocasião, os criminosos foram presos por armazenarem armas de alto poder de fogo para um grupo criminoso em Bento Gonçalves.
Foram apreendido um fuzil calibre 7.62, modelo AK-47; uma espingarda calibre .12, semi-automática; uma pistola com seletor de rajadas; e um veículo Ford Focus, que estava sendo utilizado pelos criminosos na operação da Brigada Militar.
Na audiência de custódia, a juíza alegou que a soltura está ligada a acusação de agressão por parte dos brigadianos aos criminosos. O entendimento da magistrada é de que houve abuso por parte dos policiais do 4° BPCHQ (4°Batalhão de Polícia de Choque) e da PATRES ao realizarem a prisão.
A juíza Fernanda Ghiringhelli de Azevedo alegou ainda que a prisão em flagrante não pode ser configurada quando se compactua com a violência praticada por agentes públicos.
Além da acusação de violência por parte dos brigadianos, a juíza determinou que a Corregedoria Geral da Brigada Militar realize uma investigação sobre a conduta dos policiais.
Os criminosos, soltos 24 h após a ocorrência no Distrito de Faria Lemos, possuem diversos antecedentes policiais por tráfico de drogas, receptação, associação criminosa, roubo, posse de drogas e adulteração de sinal identificador de veículo, dentre outros. A Polícia Civil também investiga a participação dos mesmos em recentes homicídios cometidos na cidade.
Confira a íntegra do texto do documento de soltura expedido pela juíza
“Trata-se de auto de prisão em flagrante pela prática, em tese, de delito de porte/posse ilegal de armas de fogo e munições, de uso restrito e permitido, ocorrido em 15/09/2024, às 14h30min, tendo sido presos em flagrante.
Designada audiência de custódia (evento 6, DESPADEC1), e intimadas as partes, o Ministério Público postulou a decretação da prisão preventiva dos flagrados, para garantia da ordem pública e por conveniência da instrução criminal (evento 16, PROMOÇÃO1).
Realizada audiência de custódia (evento 20), na qual a defesa postulou a não homologação do APF (evento 20, VIDEO6).
Com vista dos autos, a defesa sustentando “ilegalidade da prisão”, postulou a liberdade provisória e, subsidiariamente, a substituição da prisão por medida cautelar diversa; por fim, requereu diligência (evento 22, PET1).
Vieram os autos conclusos.
Decido.
I – Da não homologação do Auto de Prisão em Flagrante:
Os relatos durante a audiência de custódia (evento 20), encontram consonância nos autos de exame de corpo de delito (evento 1, OUT1, fls. 58/59), diante da constatação, pelo perito:
a) em relação da presença de “presença de leve edema e eritema torácico lateral à esquerda. escoriação irregular em primeiro espaço interdigital da mão direita. presença de edema e mancha equimótica vermelha-arroxeada, de bordas esmaecidas e mal delimitadas, localizadas na região lateral da coxa esquerda (10.0cm por 7.0 centímetros) e perna esquerda. leve escoriação superficial em face medial do joelho esquerdo e tornozelo esquerdo”; e
b) em relação da presença de “leve edema e eritema malar à esquerda”.
Note-se que. por ocasião da submissão ao exame pelo médico legista haviam informado agressões pelos policiais militares, cujas lesões verificadas, inclusive, coincidem com o que foi mencionado, pelo perito, no item “HISTÓRICO” dos respectivos AECDs.
Não bastassem as lesões constatadas nos flagrados, não há, nos relatos dos policiais militares, qualquer referência a eventual resistência por parte que justificasse uso de força para contê-los.
Nesse contexto, não há como se homologar o auto de prisão em flagrante, sob pena de se compactuar com a violência praticada por agentes públicos que, infelizmente, não é incomum no Brasil.
O Estado tem o dever de, no combate à criminalidade, agir nos limites da lei, sem lançar mão de agressões ou tortura, sob pena de responder por abuso de autoridade, ou seja, equiparar-se àqueles cujas condutas ilícitas cabe aos órgãos da segurança prevenir e reprimir (dentro da legalidade).
Com relação à conduta dos policiais militares, de ingressar em domicílio alheio sem mandado de busca e apreensão, aguarde-se a conclusão do IPL.
Diante do exposto, deixo de homologar o auto de prisão em flagrante e determino o imediato relaxamento da prisão dos flagrados.
Expeça-se alvará de soltura, devendo serem colocados imediatamente em liberdade, se por outra razão não estiverem recolhidos.
Ao serem colocados em liberdade deverão informar seus endereços atualizados completos e, se possível, telefone celular, para viabilizar futuras intimações.
II – Em razão da declaração dos flagrados sobre agressão física e tortura perpetrada pelos policiais militares do Batalhão de Choque, determino a adoção, por parte da Corregedoria Regional da Brigada Militar, de providências cabíveis para a investigação da reclamação, nos termos da Resolução nº 213/2015, do Conselho Nacional de Justiça.
Assim, encaminhe-se à Corregedoria Regional da Brigada Militar cópia integral do APF, dos vídeos da audiência de custódia e da presente decisão, solicitando que as providências sejam, oportunamente, informadas a este Juízo.
III – Defiro o pedido da defesa de que seja oficiado à Secretaria Municipal de Segurança de Bento Gonçalves, solicitando a remessa dos vídeos das câmeras de monitoramento instaladas na ERS 470, próximo ao trevo de acesso a Faria Lemos, relativas ao dia 15/09/2024, no horário compreendido entre 14:00 e 15:00;
IV – Considerando que o flagrado informou que seu tímpano foi lesionado por um tiro dado próximo de seu ouvido, e que está com hemorragia, determino que seja encaminhado a atendimento médico, com brevidade, pela Administração prisional, que deverá remeter a este Juízo, tão logo expedida, a documentação a respeito de tal atendimento.
A presente decisão servirá como ofícios.”
Jornalismo Difusora – Unidade Móvel da Rádio Difusora
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