MPT obtém condenação da terceirizada que contratou trabalhadores encontrados em condições análogas à escravidão em Bento Gonçalves

Sentença, passível de recurso, condena contratante ao pagamento de mais de R$ 3 milhões a título de danos morais, a ser integralmente distribuído aos trabalhadores resgatados

Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul obteve, em uma Ação Civil Coletiva (ACC) julgada na 2ª Vara do Trabalho de Bento Gonçalves, condenação da empresa terceirizada Fênix Serviços Administrativos e Apoio e Gestão de Saude Ltda., responsável pela contratação e deslocamento para o Rio Grande do Sul dos 210 trabalhadores encontrados em condições análogas à escravidão em Bento Gonçalves em 22 de fevereiro de 2023. Pela decisão, proferida pelo Juiz do Trabalho titular Silvionei do Carmo, a Fênix, seus proprietários e outras empresas associadas aos donos foram condenados ao pagamento de R$ 3.009.000,00 (três milhões e nove mil reais), valor que será revertido aos trabalhadores resgatados.

Esse valor vem se somar a outros R$ 2 milhões já pagos aos trabalhadores pelas três vinícolas contratantes do serviço terceirizado – negociado em um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado ainda em março de 2023 e que contemplou também o pagamento de R$ 5 milhões em danos morais coletivos, revertidos a projetos sociais da Bahia e da serra gaúcha. Esses valores também não prejudicam as ações individuais ajuizadas por trabalhadores lesados.

O processo

A ação foi ajuizada contra a Fênix e o proprietário contratante, Pedro Augusto de Oliveira Santana, ainda em março de 2023. Na época, as negociações de Compromisso de Ajuste de Conduta não evoluíram justamente porque o grupo empresarial não anuía com o pagamento de indenização. Com a ação, o MPT também obteve, em decisão liminar proferida pelo mesmo magistrado e agora confirmada em sentença, bloqueio de bens para garantir o pagamento da indenização aos trabalhadores.

A sentença é passível de recurso. Se a condenação for mantida ou não houver recurso, terá início a fase de execução, na qual os condenados poderão pagar voluntariamente os valores determinados. Se não houver pagamento voluntário, os bens já bloqueados pela Justiça serão vendidos para garantir o pagamento.

O caso

Em fevereiro de 2023, foram encontradas mais de 200 pessoas alojadas em condições degradantes, após denúncias realizadas por um grupo de trabalhadores que havia fugido do local e denunciado o caso à PRF. Os trabalhadores eram arregimentados para prestar serviços por intermédio da Fênix Serviços Administrativos e Apoio e Gestão de Saúde Ltda. a vinícolas da região, em especial na colheita da uva. As idades dos resgatados variavam entre 18 e 57 anos, e a maioria era de origem baiana.

O MPT atuou no resgate dos trabalhadores, garantindo seu retorno seguro às cidades de origem, recebimento dos salários e verbas rescisórias. A instituição criou um Grupo Especial de Atuação Finalística (GEAF) para investigação do caso, reunindo procuradoras e procuradores da Bahia e do Rio Grande do Sul. As investigações apontaram que, no momento da contratação, os trabalhadores recebiam a promessa de que receberiam alimentação, hospedagem e transporte, mas, chegando ao Rio Grande do Sul, eram informados de que deveriam pagar pelo alojamento, começando a trabalhar já em dívida. O local de alojamento também apresentava péssimas condições de habitabilidade, tinha registros de superlotação e alguns resgatados relataram ameaças, intimidações e agressões físicas. Foi apreendida no local uma arma de choque e spray de pimenta. No total, foram 210 trabalhadores resgatados, sendo 207 encontrados na pousada e mais três que haviam retornado à Bahia anteriormente, com auxílio de familiares.

TAC paradigmático

Em março de 2023, as três vinícolas que se beneficiaram da mão de obra dos resgatados assinaram um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) com o MPT-RS com estabelecimento de 21 obrigações de cumprimento imediato. As empresas também se comprometeram não apenas a contratar empresas especializadas no serviço, como também a assumir corresponsabilidade pela fiscalização da cadeia produtiva. O TAC também determinou o pagamento, por parte das vinícolas, de R$ 7 milhões. Desses, R$ 2 milhões foram pagos aos trabalhadores resgatados.

O TAC estimulou o aumento da formalização das contratações no setor e a melhoria das condições de trabalho na safra da uva, conforme foi constatado na Operação In Vino Veritas, na safra de 2024 (leia mais aqui).

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ACC 0020243-42.2023.5.04.0512

Fonte: Ministério Público do Trabalho – RS / Imprensa

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