Dom José Gislon – A Quaresma e a misericórdia de Deus

“Devemos ter presente que o tempo da Quaresma é sempre uma oportunidade para deixarmos que Deus toque o nosso coração com o seu amor e a sua misericórdia. Ela tem a força de nos purificar e nos revigorar, humanamente e espiritualmente”

Estimados irmãos e irmãs em Cristo Jesus! Iniciaremos, com a celebração da imposição das cinzas, no próximo dia 14, quarta-feira, o tempo da Quaresma, em preparação à celebração da Páscoa do Senhor Jesus. A Igreja, consciente da sua missão de anunciar o Evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo, na espera do Reino de Deus, nos motiva a percorrer um caminho de mudança interior, para redescobrirmos a beleza da vida nova, que nasce do encontro com a misericórdia de Deus.

Nos últimos 60 anos, a Igreja Católica no Brasil envolveu a comunidade eclesial com a Campanha da Fraternidade, que abordou temas importantes da realidade social brasileira, à luz da Palavra de Deus. Nem sempre os temas abordados agradaram a todos, mas no geral, motivaram o surgimento de políticas públicas e uma infinidade de ações por parte das comunidades e da sociedade, que ajudaram milhões de pessoas a terem mais dignidade de vida.

A Campanha da Fraternidade de 2024 tem como tema: “Fraternidade e Amizade Social”, e o lema: “Vós sois todos irmãos e irmãs” (cf. Mt 23,8). Ela nos convida a refletirmos, à luz da Palavra de Deus, neste tempo da Quaresma, sobre a nossa realidade de povo de Deus a caminho da casa do Pai, para abrirmos o coração e nos empenharmos na construção de uma sociedade na qual as relações sociais não sejam pautadas pela exclusão, mas pelo diálogo, a amizade, a acolhida e o respeito pelo outro.

Devemos ter presente que o tempo da Quaresma é sempre uma oportunidade para deixarmos que Deus toque o nosso coração com o seu amor e a sua misericórdia. Ela tem a força de nos purificar e nos revigorar, humanamente e espiritualmente. Segundo Santo Agostinho, o coração do homem é o homem no seu íntimo mais profundo, mas para olhar na profundidade de si mesmo, deve fazê-lo com a luz de Deus, isto é, a sua misericórdia.

Quando deixamos que a misericórdia de Deus envolva o nosso coração, saímos de nós mesmos para nos aproximar de Deus e dos irmãos. Derrubamos os muros dos preconceitos, que nos impedem de acolher o outro com a sua realidade e o seu modo de pensar. O cristão, de forma livre e responsável, tem o dever de identificar a necessidade de sua conversão, para reconstruir a harmonia com o Senhor, destruída pelo pecado, mas também a harmonia com os irmãos, através do diálogo, evitando a instrumentalização da fé, que alimenta o ódio e as divisões, e que fragiliza toda a sociedade.

O caminho dessa conversão passa pelo coração, pela humildade, pelo desprendimento, por atitudes e gestos que manifestam a presença de Deus na nossa vida. Geralmente somos motivados a percorrermos um caminho penitencial, através da oração, do jejum e da esmola, que em outras palavras é a caridade. Creio que todos nós, à luz da fé no Senhor Jesus, esperamos poder celebrar a Páscoa do Senhor renovados humanamente e espiritualmente pelo caminho quaresmal, percorrido no silêncio, na oração, na escuta e no diálogo com Deus e com os irmãos.

+ Dom José Gislon, OFMCap.
Bispo Diocesano de Caxias do Sul

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