A Delegada de Polícia Caroline Virginia Bamberg Machado, que conduziu as investigações na época em que o menino Bernardo Boldrini foi morto, em abril de 2014, foi a única testemunha ouvida neste primeiro dia do júri do réu Leandro Boldrini, pai da criança. Assim como em 2019, quando os quatro réus foram julgados, o depoimento da Policial foi longo; durou cerca de 6 horas. Pela manhã, houve o sorteio dos jurados, a reprodução de vídeos resgatados do celular do réu e de interceptações telefônicas, por parte da acusação.
Caroline relembrou detalhes das investigações que levaram a Polícia a indiciar Leandro Boldrini, Graciele Ugulini, Edelvania Wirganovicz e Evandro Wirganovicz. Para a Delegada, Bernardo era considerado um “estorvo” para o novo núcleo familiar formado pelo pai e a madrasta, que agora eram pais de uma menina. Afirmou que havia um “desleixo evidente” em relação ao bem-estar do menino, que o casal tinha “uma ideia fixa de se livrar da criança” e que Leandro Boldrini foi o mentor do crime.
O julgamento de Leandro Boldrini seguirá nesta terça-feira (21/03/23), a partir das 8h30min, com a oitiva de testemunhas. O Tribunal do Júri é presidido pela Juíza de Direiro Sucilene Engler Audino e acontece no Salão do Júri do Foro da Comarca de Três Passos, no noroeste do Estado.
Relacionamento em família
Bernardo desapareceu no dia 04/04/14. Leandro Boldrini registrou o desaparecimento do filho à Polícia no dia 06/04/14 (o MP denunciou o réu por falsidade ideológica, por este fato). As investigações começaram no dia seguinte. A Delegada conversou com professores, familiares, amigos, colegas e funcionários de Leandro.
De acordo com a Policial, colegas do médico estranharam a frieza dele após o desaparecimento do filho. Outras testemunhas relataram que o menino tinha problemas de relacionamento com o pai e a madrasta. “Diante dos vídeos resgatados, dos relatos das testemunhas, concluímos que havia um desamor muito grande. Bernardo não se encaixava no novo núcleo familiar”, afirmou a Delegada.
Caroline conversou também com o Juiz e a Promotora de Justiça, que atuavam na Comarca na época, e eles informaram que o menino os procurou para uma audiência porque queria poder brincar com a irmã caçula, ter uma chave de casa/controle remoto e comida na hora certa.
A Delegada afirmou que Bernardo amava o pai, dizia que ele era um “herói”, que “salvava vidas”. O menino não comentava o que acontecia em casa, como as brigas vistas nos vídeos resgatados do celular de Leandro, mas confirmava que não gostava da madrasta. Gostava de visitar as casas dos amigos, onde receberia atenção e se sentiria amado.
Midazolam
Nas interceptações telefônicas entre Graciele e Edelvania Wirganovicz (já julgadas e condenadas), a Polícia percebeu uma combinação de álibis entre elas. Foi a amiga da madrasta quem confessou o crime e apontou o local onde estava o corpo, encontrado em 14/04/14.
Edelvania revelou detalhes da preparação do crime, como a compra de soda cáustica, de uma pá e deu detalhes do local onde o cadáver seria desovado. Disse que Graciele iria dar um “comprimidinho para ele (Bernardo) se acalmar”, para poder levá-lo até Frederico Westphalen. A Polícia consultou as prefeituras de Três Passos e de Frederico Westphalen se houve compra de Midazolam (medicamento de uso controlado) naqueles dias. No dia 02/04/14 (antevéspera do desaparecimento do menino) houve o registro de uma venda da medicação em comprimido à Edelvania, com receituário assinado por Leandro Boldrini.
Quando o médico foi comunicado pela Polícia dos fatos, ele teria perguntado se havia provas contra ele. Com a descoberta do corpo, a prisão de Boldrini e da companheira foi decretada, além da de Edelvania.
Prisão
De acordo com a testemunha, até o momento da prisão, Leandro defendia a inocência de Graciele, mesmo sabendo dos sentimentos dela e das ameaças feitas ao menino.
O réu informou à Polícia que Graciele e Bernardo foram à cidade vizinha para comprar um aquário e peixes para o menino porque era algo que ele queria muito. Apesar das desavenças entre os dois, Leandro disse que Bernardo foi junto com a madrasta para que não ficasse sozinho, o que causou estranheza aos investigadores.
Já presos, Caroline disse que Leandro não demonstrou preocupação por Graciele ter matado Bernardo, mas que pedia que a mulher dissesse se ele estava envolvido no crime.
Motivação
Uma amiga de Graciele procurou a Polícia e relatou que foi procurada pela madrasta de Bernardo, em fevereiro de 2014, para uma possível ajuda para colocar em prática o plano de se livrar do enteado. A testemunha disse que Graciele “pintou Bernardo com louco, esquizofrênico”.
De acordo com a Delegada, o casal tinha uma ideia fixa de se livrar do menino: “A ideia era dos dois. Graciele disse à amiga: ‘Como eu quero ele debaixo da terra, o Leandro quer ele dentro de um poço'”. Segundo Caroline, “ela (testemunha) disse que só procurou a Polícia porque Graciele isentou Leandro. Ela ficou indignada com isso, não conseguia dormir, por isso nos procurou”.
A mulher também disse que Leandro tinha medo de perder Graciele e que havia escolhido ficar ao lado da companheira. “Não me deixa com essa bucha”, teria dito ele, quando a madrasta cogitou a separação por causa de Bernardo.
Contraponto
Depois de responder aos questionamentos do Ministério Público, foi a vez da testemunha depor à defesa de Leandro Boldrini. As perguntas foram feitas primeiramente pelo Advogado Rodrigo Grecellé Vares e depois, por Ezequiel Vetoretti.
A conclusão da Polícia foi de que Leandro utilizou de Graciele para fazer contato com os outros acusados, os irmãos Edelvania e Evandro Wirganovicz. Segundo Caroline, não há prova documental nem evidência de encontro que coloque o médico e os Wirganovicz em contato direto. “Nós entendemos que ele fazia indiretamente, através da Graciele”.
A motivação de Edelvania para participar do crime teria sido financeira. Ela recebeu R$ 6 mil em espécie, das mãos de Graciele. “Havia valores em casa, ela (Graciele) cuidava da contabilidade do consultório médico. Ele (Leandro) tinha conhecimento de onde era investido este dinheiro”, afirmou a Delegada.
O receituário para compra do Midazolam tinha o carimbo do médico e uma assinatura semelhante a dele. A perícia grafotécnica foi inconclusiva, se seria autêntica ou não. No entanto, ela apontou que, naquela semana, o hospital onde Boldrini trabalhava registrou a falta desse medicamento.
A Delegada afirmou que houve uma tentativa de acordo para que Graciele e Edelvania assumissem a culpa e isentassem o médico, já que ele poderia financiar a defesa delas. Questionada sobre isso, ela esclareceu que há interceptações telefônicas de familiares falando que haveria esse acerto idealizado pelos advogados.
Um dos pontos abordados pela defesa foi o comportamento distante e frio do pai em relação ao filho. A Delegada afirmou que o perfil foi traçado com base no relato da maioria das testemunhas durante a investigação. E que o fato do médico ter tentado falar com a criança quando ela já tinha desaparecido e também registrado ocorrência na Delegacia de Polícia foram comportamentos “atípicos”.
Para Caroline, Leandro e Graciele tinham certeza da impunidade, por ele ser um médico conhecido e respeitado na cidade ou por não imaginarem que os vídeos de celular que apagaram seriam resgatados posteriormente pela Polícia. “Ele quis criar um cenário de pai preocupado”.
Os Advogados destacaram informações de relatórios telefônicos que apontaram que Leandro ligou para Bernardo em todos os finais de semana, desde o começo daquele ano, e questionaram por que a Delegada disse, então, que o pai não se preocupava com o filho. “Havia ligações, mas não sei se se completavam”.
Quanto à chave de casa e ao controle remoto do portão que o menino alegava não ter, havia depoimentos de que ele tinha e outros dizendo que não tinha.
Sobre as roupas de Bernardo (a acusação diz que o menino não tinha o que vestir), a Delegada disse que foi na casa dos Boldrini e que viu superficialmente o roupeiro do menino: “Achei pouca roupa, não tinha muitas, não”.
À defesa de Leandro Boldrini, a testemunha disse que o caso repercutiu na sua carreira, tanto do ponto de vista positivo quanto negativo. Explicou que, ao mesmo tempo em que depois disso foi promovida, sofreu ataques pessoais nas redes sociais pela condução do caso.
A Delegada Caroline hoje atua na Divisão Especial da Criança e do Adolescente, em Porto Alegre.
Fonte: TJRS
Foto: Márcio Daudt – DICOM/TJRS
PG
Em Pequim, RS Day reforça parcerias estratégicas do Rio Grande do Sul com a China
Segundou de Oportunidades: CIEE-RS inicia a semana com mais de 3,8 mil vagas de estágio e bolsas de até R$ 1,8 mil
Dom José Gislon – Um Rei fiel e servidor